27 de abril de 2014

[DDI] E assim terminamos...




E foi assim que nós terminamos. 

Não houve gritos, surtos ou acusações. Não rasgamos roupas nem jogamos objetos pela casa. Não procuramos culpados, mal conhecíamos o crime, mas sabíamos que ele tinha acontecido. As evidências estavam espalhadas pelos cômodos, nos porta-retratos tão antigos que nem se parecem mais com a gente, no quarto vazio esperando eternamente a chegada do seu novo membro, que por fim não veio (não estávamos prontos, nunca era o tempo certo), na cama com os travesseiros separados, na mesa vazia e no jardim abandonado. 

Não terminamos aos berros, mas sim no silêncio. Não aquela quietude acolhedora de fim de tarde, mas naquele vazio das palavras não ditas. O silêncio nos dominou aos poucos, começou pelas conversas noturnas (estávamos sempre tão cansados), depois foram os telefonemas, os almoços e os cafés da manhã, por fim nos tomou como um todo, falávamos apenas o essencial sobre contas e compras, nunca mais sobre nós mesmos. 

O fim chegou devagar, quase como as estações do ano. Não percebemos as sutis mudanças até que elas estivessem completas. As folhas das árvores ficaram amarelas e caíram e nós não vimos. Na verdade, perdemos tantas coisas. 

Não sei se poderíamos ter feito algo diferente. Como unir caminhos que se separaram tanto? Não nos reconhecemos e com isso perdemos também um pouco do que fomos para nos tornar o que somos: esses tão conhecidos estranhos um para o outro. 

E assim terminamos: suas coisas em uma caixa, as minhas em uma mala. Penso o quanto entregamos um ao outro para sairmos com tão pouco. A casa vazia ficou com a maior parte, com os sorrisos e amores, e levamos apenas o que restou. 

Engraçado o quanto pessoas antes tão íntimas agora não sabem como dizer adeus; o abraço é estranho, apertamos as mãos, isso parece tão certo e tão errado ao mesmo tempo. O peso da chave ainda no chaveiro daquela que por muito tempo foi a nossa casa oprime minha respiração, separo ela das demais e vejo que você faz o mesmo. Um sorriso triste em nossos rostos reflete os últimos pontos. 

Entro no meu carro e você no seu, como já fizemos em várias manhãs; mas dessa vez não voltaremos. Dou a última olhada no retrovisor, você já está partindo. Com isso fecho os olhos e também deixo para trás aquilo que há tanto conhecíamos como amor. 

Daniele Vintecinco





DDI – Delírios, Devaneios e Insensatez - um espaço em que escrevo todos os pensamentos, delírios e devaneios que vêm a minha cabeça, o que é no mínimo uma insensatez. 

2 comentários:

  1. Que lindo! Adoraria que fosse assim.....

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  2. Olá, visitei seu blog e achei ele muito lindo *-* Estou seguindo. Parabéns pelo trabalho!
    http://apenasumaleitura.blogspot.com.br/

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